Há quase quatro décadas, o pescador sergipano Cícero Medeiros, da
Colônia Z7, do município de Neópolis, encontra nas águas do São
Francisco o ofício aprendido ainda na infância e que até hoje lhe
permite sustentar a família. “Meus pais eram pescadores e sobreviviam
da pesca. A pesca é tudo para mim, foi como pude dar estudo aos meus
filhos. Tenho conhecimento desde 1979. Nesse ano, foi a maior cheia que
encontrei”, conta orgulhoso.
Em
29 de junho, é comemorado o Dia do Pescador. A atividade tem enfrentado
algumas dificuldades em virtude da diminuição dos estoques pesqueiros,
ocasionada por diferentes fatores, como construção de barragens,
poluição, estiagem, entre outros. Na bacia hidrográfica do São Francisco,
a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba
(Codevasf) tem contribuído com a recuperação desses estoques por meio
de práticas como os peixamentos.
“É
um trabalho fruto de muita pesquisa que traz grandes benefícios para a
sociedade e para o meio ambiente. Com os efeitos da mudança climática e
da degradação dos ecossistemas aquáticos, os peixamentos são importantes
para a recuperação da biodiversidade nos rios e lagoas e a consequente
garantia do sustento do pescador`, afirma Inaldo Guerra, diretor da área
de revitalização da Codevasf.
Somente em 2017, cerca de 2,6 milhões de alevinos já foram inseridos em trechos do rio localizados nos estados de Minas Gerais,
Pernambuco, Sergipe e Alagoas. “A Codevasf tem nos ajudado bastante com
essa parte de soltar alevinos no rio. Recentemente, estão soltando a
xira, que é um peixe que está diminuindo e só não diminuiu mais porque a
Codevasf faz esse trabalho”, reforça o pescador Cícero Medeiros.
Para viabilizar as ações de repovoamento, inicialmente são selecionadas
matrizes capturadas no meio ambiente – prática permitida através de
licença ambiental –, as quais são levadas aos Centros Integrados de
Recursos Pesqueiros e Aquicultura da Codevasf para serem aclimatadas.
Algumas espécies se reproduzem naturalmente desde que o ambiente esteja
preparado para isso; para outras, é necessário utilizar o processo
de reprodução induzida. Havendo sucesso na reprodução, é realizado o
processo de alevinagem, no qual as larvas de peixes são cuidadas para se
tornarem alevinos fortes e saudáveis, com tamanho adequado para os
peixamentos.
“Os peixamentos normalmente são demandados por prefeituras e pela
própria sociedade em regiões que os estoques pesqueiros já estão
comprometidos. Essa ação é acompanhada, na maioria das vezes, de
reuniões e palestras prévias ao peixamento, onde são inseridos conceitos
de educação ambiental para a população, explica o engenheiro de pescaHermano
Luiz Carvalho Santos, chefe da Unidade de Recursos Pesqueiros e
Aquicultura, vinculada à Gerência de Desenvolvimento Territorial da
Área de Revitalização da Codevasf.
Com os alevinos prontos para o peixamento, o transporte é realizado por
meio de sacos plásticos ou em caixas de transporte de peixes vivos -
“transfish” - até o local previamente escolhido pela equipe técnica da
Codevasf. Chegando ao ponto escolhido, os peixes são aclimatados para
que as características físico-químicas da água utilizada no transporte
fiquem próximas ao do local onde eles serão soltos.
“O ato de soltar os peixes muitas vezes é realizado pela população
local que participou das reuniões e palestras. O objetivo é
empoderá-las, de forma prática, com os conceitos de educação ambiental
repassados previamente pelos nossos técnicos”, completa Santos.
Tecnologia e revitalização - Nos peixamentos realizados ao longo da bacia do São Francisco, a
Codevasf utiliza espécies nativas pelo fato de já estarem estabelecidas
no ecossistema, evitando, com isso, desequilíbrio ecológico. Nos últimos
anos, as principais utilizadas em ações de repovoamento foram: pirá,
curimatã pacu, curimatã pioa, matrinxã, piau, pacamã, cascudo e piaba.
“Em alguns locais do baixo São Francisco, algumas espécies exóticas,
como o tambaqui e a tilápia, já estão estabelecidas no ambiente e podem
ser legalmente inseridas. Entretanto, não fazemos peixamentos com essas
espécies diretamente no rio, pois queremos revitalizá-lo com as espécies
que são naturalmente dele. Os peixamentos com espécies exóticas são
feitos apenas em corpos d’água que não tem acesso ao São Francisco, como
lagoas isoladas e aguadas”, explica o engenheiro de pesca da Codevasf,
Pedro Reis.
A Codevasf foi uma das pioneiras no desenvolvimento de tecnologias de
reprodução de peixes nativos do rio São Francisco. O programa de
peixamento teve início em 1983, na represa de Três Marias, com
utilização de alevinos de curimatãs (pacu e pioa), matrinxã, piau
verdadeiro, pacamã e surubim.
Ao serem comparados os rendimentos da pesca com redes de emalhar antes e
depois dos peixamentos, verificou-se um acréscimo significativo,
considerando-se as espécies utilizadas nas estocagens. O matrinxã, que
estava extinto no reservatório de Três Marias desde o final da década
1970, começou a aparecer nas pescas artesanal e esportiva a partir da
metade da década de 1990. “Desde essa época, desenvolvemos a tecnologia
de reprodução de 35 espécies de peixes nativos do São Francisco e temos
continuado com esse trabalho, inserindo, em média, mais de 6,5
milhões de alevinos nativos na bacia por ano. A Codevasf é a
principal instituição brasileira a realizar esse tipo de ação”, informa
Reis.
Recomposição da ictiofauna - Por meio de seus sete Centros Integrados de Recursos Pesqueiros e
Aquicultura implantados em quatro estados, a Codevasf atua na
preservação da ictiofauna das bacias hidrográficas, bem como em sua
revitalização, por meio da realização de peixamentos e pesquisas
aplicadas.
Desde 2007, cerca de 146 milhões de peixes foram produzidos
para a recomposição e manutenção da ictiofauna com espécies nativas
do São Francisco e espécies não nativas destinadas ao apoio da
piscicultura na bacia. Para os peixamentos, foram destinados 66 milhões
de nativas, entre elas cari, pacamã, piau, curimatã pacu, curimatã pioa,
matrinxã, e piaba.
Os Centros Integrados são considerados referência no desenvolvimento de
pesquisas e tecnologias de reprodução, larvicultura e alevinagem de
espécies nativas do rio. São eles: Três Marias e Gorutuba, em Minas
Gerais; Xique-Xique, na Bahia; Bebedouro, em Pernambuco; Betume, em
Sergipe; e Itiúba, em Alagoas.
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